Sentinela da Minha Ausência
- Felipe Manuel
- 3 de mai.
- 2 min de leitura
Às vezes eu fico só... observando.Sem muito propósito, sem muito foco. Só deixo os olhos fixos naquela moldura de mundo que a janela me dá. As estações passam com uma leveza quase cruel, como se ignorassem completamente o que ficou parado aqui dentro. A primavera, por exemplo... ela foi embora faz dias. E eu nem percebi quando chegou. Talvez estivesse ocupado demais tentando existir de algum jeito. Tem uma brisa fria agora. Ela entra sem pedir licença e me lembra de que ainda estou aqui. Mas... o que isso significa? Estar aqui? Sinto como se fosse só um boneco de pano, largado num canto qualquer do tempo. Um desses sem brilho nos olhos, sem cor nas bochechas, sem movimentos próprios. Só um molde... preenchido por silêncio. Viver no automático não dói na pele, sabe? Dói no vazio. Dói quando você tenta lembrar em que momento largou o volante e simplesmente deixou tudo ir. Me pego repetindo isso mentalmente: quando foi que parei de me dirigir? E mesmo sem resposta, sigo. Às vezes espero que, ignorando o peso, ele desapareça sozinho. Que seja só uma questão de tempo até algo reacender. Mas esse "tempo"... ele nunca tem pressa, nunca tem rosto. Eu me sinto como o Pinóquio, só que sem Gepeto. Sem o alguém que acreditaria o suficiente pra me dar vida. Só mais um pedaço de madeira entalhado pelos dias. Me afundo nos meus próprios defeitos como quem se afoga lentamente — e ainda assim, sem fazer barulho. Acho que dormir demais também tem seu preço. Acordei e já era outro tempo. Outras pessoas, outras vontades, e eu... ainda era o mesmo. Será que dá pra voltar de um lugar que nem sei quando comecei a ir? Será que perdi tudo ou só deixei cair pelo caminho? Às vezes olho pra fora e vejo o tempo escorrendo como areia entre os dedos. O meu tempo não vale ouro. O meu tempo não constrói. Ele só some... e ninguém percebe. Talvez se eu me alimentasse de esperança... daquelas simples, que a gente tinha quando criança... talvez alguma coisa mudasse. Mas até isso soa distante. Como um eco do que um dia foi. Procuro pedaços de mim. Se alguém achar, por favor... me avise. Me perdi em dias tão normais que nem pareceram dias. Me escondi entre cafés mornos e olhares perdidos. Me tornei sentinela da minha própria ausência.
Eu não sei onde estou. Mas sei que não estou aqui.
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